Quem não se move, não sente as correntes que o prendem. (Rosa Luxemburgo).

quarta-feira, 12 de maio de 2010

Desafogo

Pensei nesse blog para trocar sal e segredos. Necessidades e confissões. Encontrar-me e encontrar outras pessoas...
Mas hoje escrevo essencialmente para mim mesma, tentando resolver as contradições dialéticas dessa existência bruta.
Quero, desesperadamente, estar comigo!
Algo tão difícil como estar com várias pessoas ao mesmo tempo. Será porque não sou uma, mas tantas????
Ou porque talvez, sequer posso compreender uma de mim?
Subjetivo demais para quem tem que falar da história do mundo em algumas pouquissimas horas, o que precisa ser mais concreto que concreto. Essa sou eu durante todo o dia: mensageira da história da humanidade, da história feita pelos heróis, pelos donos e senhores do mundo.
Mas onde estava o povo, principalmente sua parte feminina, quando Otto Von Bismarck foi nomeado chancelar da Prussia?? Por que ninguém fala da declaração dos direitos das mulheres escrita por mulheres durante a Revolução Francesa, em resposta a tão dita Declaração universal do direitos do HOMEM e do cidadão (que por sinal negou o direito de voto às mulheres)???Perguntas que eu gostaria de responder, mas que os livros ainda não escreveram!!!!!
Estar comigo, portanto, é viver essa parte invisível da história... e eu, assim como tantos, continuo habituada a contar só as histórias dos grandes...Será que estou fadada a estar sempre só nessa jornada?
Fecho a noite fechando meu computador: nego-me, por hora, a continuar revisitando os grandes. Que espere o sol raiar para que eu volte a arena do leões...
A.

sábado, 8 de maio de 2010

Heroína invisível

À minha heroína

Conheci essa mulher há exatos 32 anos e 8 meses. No auge da sua linda juventude. Apaixonada, poetisa e cheia de cartas de romance. Parece-me que desde sempre adorava mexer nas unhas, como o faz até hoje.
Sonhava em ser jornalista, talvez escrever as coisas que seu coração sentia e que sua consciência já pressentia. Saber de tantas outras ruas que não apenas a “antiga 18”...
Mas casou-se! Mudou os sonhos talvez – ou deixou-os guardados até hoje?
O que importa é que viveu sonhando. E lutou bravamente pelos sonhos e por nós que vivíamos sob suas asas.
Não sei se por amor, ou por falta dele, libertou-se das correntes de um casamento que não a fazia feliz. Lembro-me vagamente das dores do seu coração. Do medo de perder as estrelas que iluminavam o fundo da sua alma. Mas lembro-me da alegria do recomeço. Foi nas letras que encontrou as ferramentas da liberdade. Letras que precisou abandonar quando casou-se e que lutava agora para reencontrar.
Reencontrar-se talvez seja a tarefa mais difícil quando se busca a liberdade. Saber novamente quais são seus gostos, seus almoços, seus livros, saber-se mulher inteiramente... Às vezes, leva-se uma vida para concluir essa empreitada...
Nunca conheci tamanha guerreira. De paus e pedras, e com o coração cheio de amor, lutou cada dia por cada pão e por cada alegria.
E como foi dura a vida com essa mulher. Vida bruta, egoísta, impiedosa. Essa vida que quis a todo custo roubar-lhe os sonhos, o amor e a esperança. A cada ano, a cada obstáculo. A fome, o desemprego, as dívidas, o machismo, o desamor, o ex-marido, e às vezes até os filhos...
Só mais tarde fui entender os princípios que guiava sua luta: a desalienação. Minha querida mãe lutou a vida toda pela desalienação. Encontrar novamente a essência do ser humano: essa é a mais bela proposta de Marx. E minha mãe fez isso por toda a vida. Quando incentivou que cada uma de suas estrelas brilhasse mais, quando tentou explicar que o dinheiro não era tudo e o mais importante era o amor. Insistiu que a paz poderia compensar a falta daquilo que nosso dinheiro não podia comprar...
Depois de anos, orgulho-me da greve que ela fez para implantar a jornada de 44 horas na fábrica que trabalhava. Da luta de uma mulher jovem que acordava de madrugada no domingo para entregar os pães na padaria, afinal, era o extra do fim de semana que comprava a comida da semana. Das tortas de limão trazidas pela manhã, depois de cumprir o turno da noite, afinal o adicional noturno ajuda a pagar aquela conta de luz atrasada...
(um grande suspiro, um longo e silencioso choro) Como eu gostaria de ter olhado-te, àquela época, com meus atuais olhos de 32 anos e 8 meses.................
E hoje, essa mulher ao completar meio século de primaveras, voltou aos bancos escolares, melhor dizendo: encontrou os bancos universitários. Aquele sonho de menina parece se realizar agora, 32 anos e 8 meses depois.... Com a sua vida, sem uma palavra sequer, você ensina-me que não existe tempo, muros e fronteiras, dificuldades e obstáculos que nos façam morrer quando se sonha e se luta.
Foi forte nas suas convicções. Decidida e dedicada... Guerreira de uma luta que talvez somente ela possa nos contar um dia... Certamente, muito mais que eu, encerra no peito e nas linhas do seu rosto todas as lutas dessas mulheres trabalhadoras. Sua história invisível, heroína de todos os dias, de todas as trajetórias entre sois e luas. A vida deve-te, com certeza, muitas honrarias!
Brava guerreira, querida amiga, adorada e sagrada mãe. A você minha imensa admiração, a mais terna gratidão e meu eterno amor.
Beijos,
Sua filha Alê